domingo, 18 de janeiro de 2009

Newton Cardoso e o divórcio de 2,5 bilhões

A deputada Maria Lúcia Cardoso briga na Justiça para receber metade da fortuna do marido, o ex-governador mineiro Newton Cardoso, e ele ainda responderá a um processo por arranhá-la e puxar seu cabelo
O divórcio é uma experiência dolorosa. Quando envolve um político famoso, há chances de que esse sofrimento ocorra em praça pública. O risco cresce se o rompimento implica a divisão de uma fortuna bilionária construída de forma nebulosa. Em casos assim, episódios de violência doméstica podem transformar a separação em rumoroso escândalo.
É justamente o que está ocorrendo com o ex-governador de Minas Gerais Newton Cardoso e a deputada Maria Lúcia Cardoso, ambos do PMDB. Há dez dias, o Ministério Público mineiro denunciou o ex-governador por agredir fisicamente a deputada quando eles ainda viviam juntos. O crime teria acontecido em abril de 2007. Motivo: Maria Lúcia cobrou do então marido explicações sobre o fato de ele ter sido visto em companhia da amante no hotel Ritz de Londres, onde uma noite custa de 1 000 a 15 000 reais.
Newtão, como é conhecido, perdeu o controle. Puxou o cabelo da deputada e arranhou seu pescoço com as unhas. Uma das filhas do casal apartou a briga. Maria Lúcia denunciou o marido à polícia. Revelou, então, que ele a tinha espancado outras vezes. Numa delas, Newtão quebrou-lhe o nariz. Em outra, atacou-a com uma tesoura. Depois de prestar queixa, a deputada expulsou-o de casa. No início de 2008, entrou com pedido de separação litigiosa. "Eu sempre soube que ele me traía, mas fazia vista grossa. Uma hora, resolvi dar um basta", disse Maria Lúcia a VEJA.
No processo, que tramita em sigilo na Justiça de Brasília, a deputada expôs muito mais que a intimidade do casal. A ação descreve de forma minuciosa a fortuna que o político mineiro de resultados amealhou e se esforçou para esconder. Na ação, o patrimônio de Newtão é estimado entre 2,5 e 3 bilhões de reais. O valor é 200 vezes maior do que o que o ex-governador declarou à Justiça Eleitoral há dois anos e vinte vezes superior a uma estimativa feita por VEJA há sete anos com base em informações de cartórios e juntas comerciais.
A deputada sustenta que seu ex-marido é dono de 100 fazendas e diz ter documentos que provam suas afirmações em 70% dos casos. Segundo ela, seu ex-marido também teria dezesseis empresas no país, seis sediadas em paraísos fiscais, uma praia na Bahia, aviões, dezenas de carros e de imóveis, entre eles apartamentos em Nova York e Paris. Na capital francesa, Newtão teria até um hotel, o Résidence des Halles, um três-estrelas situado nas imediações do Museu do Louvre.
A deputada confirma muito do que já se sabia sobre como o ex-governador conseguiu esconder sua fortuna. O recurso mais frequente foi montar holdings empresariais e atribuir às subsidiárias delas a posse de seus bens. Com isso, Newtão dificultou o rastreamento de seu patrimônio. Outro mecanismo foi abrir empresas em paraísos fiscais, que mantêm os nomes dos acionistas em sigilo. O ex-governador fez isso para esconder, por exemplo, uma participação que tinha na mineradora Magnesita, líder na produção do mineral de mesmo nome, que é usado na produção de aço. Newtão negou ser sócio dessa mineradora até agosto do ano passado, quando ela foi vendida.
Descobriu-se, então, que ele detinha 28% do seu capital. As ações estavam sob o controle da Ovante Trading, sediada na Ilha da Madeira, e renderam 400 milhões de reais a Newtão. De acordo com sua ex-mulher, o ex-governador também guarda dinheiro na Suíça. Em 1995, ele vendeu o jornal Hoje em Dia à Igreja Universal do Reino de Deus e recebeu parte do dinheiro em uma conta bancária aberta na cidade de Fribourg em nome da empresa Panka Espace.
A deputada conta que seu ex-marido recebeu outra parte do pagamento em dinheiro vivo das mãos do bispo Edir Macedo, mandachuva da Universal.
Maria Lúcia diz que testemunhou esse e outros negócios feitos por Newtão nos trinta anos em que viveram juntos. Em 1998, eles formalizaram sua união em um cartório da cidade mineira de Japaraíba, onde a deputada nasceu. Maria Lúcia acreditou que isso e o fato de ela conhecer na intimidade as finanças do então marido seriam suficientes para que Newtão partilhasse sua fortuna com ela, em caso de divórcio. Estava enganada. O ex-governador alega que se casou em regime de "separação de bens" e anexou à ação de divórcio uma certidão de casamento na qual esse status aparece discriminado.
A deputada garante que a certidão é falsa e juntou outra ao processo, na qual se lê que a união foi celebrada com a comunhão parcial de bens, o que lhe daria direito à metade do patrimônio do casal. Evidentemente, um dos documentos é falso. Quem o apresentou cometeu crime contra a fé pública, punível com até seis anos de cadeia. O advogado de Newtão, Cláudio Donato, diz que uma sindicância realizada no cartório comprovou a autenticidade do papel apresentado por seu cliente. A deputada brande o termo de proclamas do casamento, no qual a expressão "comunhão parcial de bens" aparece datilografada e rasurada a mão. Segundo ela, foi seu ex-marido quem fez os rabiscos. Maria Lúcia exibe ainda documentos de empresas de Newtão nas quais ele declara ser casado em comunhão de bens.
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Fonte: O Globo

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